quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Grêmio 0×0 Universidad -Um resultado inexplicávele

Parafraseando Ortega Y Gasset, um jogo de futebol é feito do jogo em si e das suas circunstâncias. Quando o jogo não sai exatamente como queríamos – isto é, com a vitória do nosso time – procuramos culpados nas circunstâncias: o time estava desentrosado, o clima não ajudava – muito frio, ou muito quente -, o campo estava em más condições, os jogadores estavam cansados, a torcida não apoiou o time (quando joga em casa) ou o intimidou (quando joga fora), etc, etc. Tudo se transforma em justificativa quando não ganhamos. Isto é, tudo o que é possível transformar em justificativa, mesmo que não seja uma justificativa de fato.

O jogo Grêmio x Universidad do Chile, disputado ontem, transcorreu em uma noite bastante agradável, algo surpreendente em se tratando de verão gaúcho: a temperatura roçava os 20 graus e um vento moderado, aliado à umidade, diminuía ainda mais a sensação térmica. O gramado do estádio Olímpico estava em excelente condições,e a torcida, animadíssima. Os jogadores do Grêmio estavam em excelentes condições físicas, dormiram bem, comeram direitinho o que o nutricionista receitou, rezaram o Pai Nosso antes de entrarem no campo, fizeram o sinal da cruz do jeito certo – tudo saiu perfeito, comme il faut.As circunstâncias não atrapalharam o Grêmio.

Faltou o jogo. E o jogo foi perfeito. Nem sobrou espaço para criticar Celso Roth – outra circunstância frequentemente apontada como decisiva para maus resultados – ritualmente vaiado antes de todos os jogos: o esquema 3-5-2, que este blogueiro não tem em boa conta, funcionou como poucas vezes é capaz de funcionar. Os três meio-campistas – Adilson, Tcheco e Souza – revezavam-se na troca de posições entre as duas intermediárias, como uma rotação de time de vôlei em que o jogador ora é ponta, ora é meio de rede, ora é levantador; os dois alas – Jadilson e Ruy -, talvez as posições mais importantes do esquema, apareceram com força no ataque e guarneceram bem a defesa quando necessário; os três zagueiros – Léo, Réver e Rafael Marques – tiveram pouco trabalho defensivo e, por isso, puderam avançar com segurança para ajudar o meio-campo na destruição e até mesmo na armação de jogadas (os lançamentos de Réver da defesa para o ataque, à Bobby Moore, são uma das marcas registradas do Grêmio); e funcionou bem até mesmo o ataque que não marcou gols – Jonas e Alex Mineiro, este menos, aquele bem mais -, movimentando-se dentro e fora da grande área, confundindo a marcação e abrindo espaços. E, mais do que tudo isso – e por causa de tudo isso – funcionou bem o Grêmio. Funcionou com notável harmonia entre defesa, meio e ataque, usando a bola longa, as tabelas entre atacantes, a jogada aérea, as bolas paradas, os chutes de fora da área, enfim, todos os recursos que o futebol permite para criar situações de gol. Funcionou bem porque jogou e não deixou o Universad jogar (não tenho os números, mas o percentual de posse de bola do Grêmio deve ter ficado em, pelo menos, 75%) Tudo à perfeição. Uma atuação digna de uma estréia de Libertadores, que mostra a verdadeira cara de uma equipe e fornece os adjetivos pelos quais ela ficará conhecida pelos adversários: uma máquina bem calibrada, um exército unido pelo sangue, um grupo artístico ensaiadíssimo – o melhor que o futebol encarado coletivamente pode proporcionar. Foram três bolas na trave. Foram dezenas (sim, dezenas, sem exagero) de chances claríssimas de marcar. Foram pelo menos dois pênaltis não marcados (aí, sim,uma das circunstâncias normalmente invocadas, o juiz, pode ser responsabilizado). Foi tamanha a superioridade que o adversário só conseguia apelar para os pontapés (tiveram um expulso e poderiam ter tido mais dois, pelo menos) e para uma retranca absurda de cinco defensores, quatro volantes e um atacante solitário que só serviu para marcar a saída de bola. Um jogo para ficar na memória dos que a presenciaram, e provavelmente ficará, só que por outro motivo: como exemplo de como uma equipe pode jogar tão bem e, mesmo assim, não conseguir fazer gol.

Avaliação dos jogadores:

Victor – Impossível avaliar quem mal encostou na bola. Limitou-se a agarrar a bola vinda dos chutões que a defesa do Universidad do Chile mandava quando batia o desespero.

Réver – Não resta dúvida de que, a seguir assim, será titular da seleção brasileira. Réver lembra o inglês Bobby Moore pela facilidade no desarme e a precisão milimétrica dos lançamentos longos para o ataque, uma das marcas mais fortes deste Grêmio de 2009.

Léo – interrompeu uma sequência interminável de más atuações. Aventurou-se ao ataque com facilidade e desenvoltura e até chegou à linha de fundo para cruzar, sempre muito bem.

Rafael Marques – avançou menos para o ataque que seus dois companheiros de zaga e, por isso, apareceu menos, já que o Universidad do Chile quase nunca passava da sua própria intermediária.

Ruy – Conseguiu furar a retranca do Universidad do Chile pelo lado direito e perdeu as contas de quantos cruzamentos fez, de quantas vezes entrou pelas costas dos defensores adversários e de quantas vezes chutou a gol, com direito a bola na trave. Peça fundamental do esquema de Celso Roth, o “Cabeção” evolui a cada jogo.

Jadilson – Não obteve tanto sucesso quanto o seu companheiro do lado direito, mas suas arrancadas e sua notável habilidade dribladora, mais típica de um ponta-esquerda do que de um lateral, incomodaram e muito a defesa do Universidad. Disputa a vaga pau a pau com Rafael Santos.

Adilson – Uma gratíssima surpresa. Integrante do grupo desde 2007, quandos chegou das categorias de base, o “alemão” de *Bom Princípio nunca conseguiu garantir seu espaço no time, seja pela sequência titulares muito qualificados para a sua posição (Gavilán, Eduardo Costa e Rafael Carioca), seja pela própria indefinição sobre qual setor do meio-campo ocuparia. Adilson jogou como meia e como segundo volante, sem render o seu melhor. Com a lesão de William Magrão , conquistou a posição cercado de expectativas sobre si mesmo. No jogo de ontem, mostrou que tipo de jogador ele é: um volante de marcação forte, incansável, desarmador nato, brigador, bom na saída de bola e na chegada à frente. Um aporte excelente e um titular absoluto do 3-5-2 rothiano.

Tcheco - Junto com Adilson, o melhor em campo no jogo de ontem. Tcheco não errou um passe, um só lançamento, uma só saída de bola e uma só decisão sobre qual seria a melhor jogada a seguir. Seu corta-luz para Alex Mineiro, no segundo tempo do jogo, foi um lance memorável de quem honra como poucos a braçadeira de capitão de uma equipe. Nenhum jogador do Brasil, e poucos no resto do mundo, têm a sua visão de jogo, a sua capacidade de organizar o time a partir do meio campo, a sua doação em prol da equipe, sacrificando sem problemas o brilho individual em prol do bem coletivo. Como já dissemos várias vezes neste blog, Tcheco é o perfeito meio-campista “box-to-box” britânico, aquele que vai de uma área (”box”, em inglês) à outra do campo armando, atacando e defendendo com a mesma competência. Nenhum jogador do Grêmio toca tanto na bola quanto ele – e ainda bem.

Souza – Atuação perfeita no primeiro tempo, um pouco menos inspirada no segundo. Souza cansou de deixar adversários no chão, de arrancar em disparada para o gol, de chutar com perigo (carimbou a trave duas vezes), de cruzar para os companheiros, de tabelar com os atacantes…..inutilmente. No primeiro tempo, dividiu com Tcheco e Adilson o posto de melhor em campo. No segundo tempo, visivelmente cansado – e talvez até um pouco abatido pela falta de resultados melhores – produziu menos. A avaliação geral, porém, é muito boa.

Jonas – o mesmo atacante incansável de sempre. Participou de incontáveis jogadas de gol, movimentou-se bastante, atraiu marcação e concluiu várias vezes, além de fazer a parede muito bem apesar de seu porte franzino. Confirmou sua titularidade mais uma vez.

Alex Mineiro – o jogador menos inspirado desta noite. Participou de algumas jogadas de ataque, mas perdeu gols que um centroavante de sua categoria não deve perder e pareceu um pouco displicente em alguns momentos, destoando um pouco do espírito geral de doação irrestrita. Além disso, sua baixa estatura é um empecilho para um time que tem na jogada aérea uma de suas armas mais mortais. Se Maxi Lopez demonstrar que tem condições de jogar, Celso Roth deve considerar seriamente a sua titularidade.

Fábio Santos – Entrou no finalzinho e não teve tempo de fazer nada.

Reinaldo - Também entrou no final para dar mais mobilidade ao ataque e também teve pouco tempo

Douglas Costa – a jovem revelação também entrou no final, deu alguns dribles, algumas arrancadas, algumas jogadas de efeito (às vezes até pretensiosas e desnecessárias, quando não mal sucedidas) e não pôde ajudar muito.

Escrito por Celso Augusto Uequed Pitol

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