sábado, 13 de junho de 2009

Frei Rovílio- O ideal da leitura

A notícia do falecimento do frei Rovílio Costa nos entristece profundamente. Tivemos oportunidade de conhecer o frei em meados de 2004 e desde então nos tornamos seus admiradores. O amigo dos livros e dos gatos conquistou nossos corações por sua inteligência, sua capacidade de transmissão de conhecimentos e principalmente, pelo fato de que era uma daquelas pessoas que fazem o mundo ser um lugar mais agradável, mais feliz.Lamentamos saber que naquela casa repleta de livros e gatos não estará mais a figura física do simpático frei, mas resta o consolo de que sua obra permanecerá e seu exemplo estará presente nos corações e mentes que ele conquistou.

feiraa2

Frei Rovílio na Feira do Livro de 2008 dirigindo-se para assistir espetáculo de Ariano Suassuna

.~.~.~.~.~.

Como homenagem ao querido Frei reproduzimos aqui o texto que publicamos no jornal canoense O Timoneiro no dia 28 de outubro de 2005 .

O IDEAL DA LEITURA

Patrono da Feira do Livro é título pomposo. Então imaginamos a figura do patrono como alguém de difícil acesso, um intelectual sisudo e quase inalcançável.No entanto, a figura de Frei Rovílio Costa escolhido para ocupar o cargo neste ano desmonta totalmente esta concepção.Basta entrar nas depedências da Editôra EST para pércebermos que estamos ingressando no mundo de alguém que encara a vida e as pessoas de acordo com os valores cristãos que defende. Em meio a livros e mais livros, circula sobranceira, totalmente cônscia de seus direitos, a gata Gelina, que o patrono qualifica como gata de telhado. Neste ambiente, Frei Rovílio Costa conduz a maior editora do Rio Grande do Sul, e nos recebeu para uma entrevista, com a presença da gata, é claro.

Qual a importância de sua escolha como patrono para a Filosofia da EST?

A escolha do patrono da Feira do Livro, tanto quanto a discussão que vai começar agora sobre o Fato Literário, do qual estou entre os cinco escolhidos, não é uma escolha minha, da minha pessoa, porque não escolheriam um escritor nem um editor propriamente dito, mas uma amante seja da edição, seja do livro. As duas coisas eu as vejo como provisórias. O que é definitivo para mim é a pesquisa: seja publicando ou não, eu vou continuar pesquisando, vou continuar tentando dar ao livro a carga sentimental e afetiva para que ele não seja um intruso na mente e na vida de qualquer criança, de qualquer jovem que seja obrigado a ler inadequadamente. A escolha para patrono significa o reconhecimento de um trabalho feito, porque pelos critérios adotados até hoje, sempre se escolheu alguém da área da alta literatura, da arte, mas este ano escolheram uma ideia, um tipo de trabalho. Então os escolhidos são os mais de três mil autores que tenho publicado.

Quais os próximos projetos da EST?

O projeto principal é ir cobrindo o mais possível as etnias presentes no Brasil e Rio Grande do Sul. Nós temos coberto quase que a totalidade da etnia italiana e alemã.

Qual a relação do ideal cristão em que o senhor for formado e o seu trabalho como editor de livros?

Quando nós tomamos a história da Igreja, se diz que as duas fontes são a Bíblia e a tradição. A Bíblia é a palavra escrita, e a tradição é o boca a boca. Há verdades que estão baseadas mais no magistério da Igreja do que da Bíblia.

Como conciliar as atividades de religioso e de editor?

Eu escolhi ser religioso. Ser editor vem em decorrência. Na Universidade eu estava ligado a dois horários: o horário acadêmico e o de atividades religiosas. No resto do tempo, comecei a dar importância a escrever, a levar as outras pessoas a escrever, a pesquisar e a levar as outras pessoas a pesquisar. Editar faz parte da ocupação do tempo pessoal.

Sendo religioso, o senhor acredita em missões pessoais. Qual, então, a missão que o senhor vê na EST, e, ao mesmo tempo, qual o diferencial que o senhor vê na editora?

Alguém perguntou qual o futuro da EST, porque até o presente é um trabalho meu pessoal. São Paulo demonstra que existe a Lei e o espírito da lei, então existe o livro e o conceito (espírito) do livro. São tão importantes as obras publicadas quanto a ideia criada de que se faça cultura como cotidiano. A cultura é como a vida: não se vivem fatos esporádicos e datados, mas cada segundo do cotidiano. Como a gente não se alimenta só uma vez por ano, mas todos os dias, assim a cultura é um todo, não de um dia, mas de todos os dias. Através dos mais de rinta anos da EST, foi possível ajudar leitores e pesquisadores, que levarão as propostas da EST em suas atividades profissionais. Essa nova forma de cultura vida está assegurada, independente de a EST continuar ou não. Sua missão essencial foi realizada.

Qual o futuro do falar vêneto?

O livro Não é a morte das línguas (2000), de Claude Hagége, prevê que, das 12 mil línguasm dentro de cem anos, seriam 6 mil. Perde-se uma língua por semana. Mas, uma pesquisa recente está mostrando que também estão se formando novas línguas. E agora também há o movimento na Itália para reconstituição do ensino das línguas regionais e de grupos minoritários, com respaldo político. Decisões politicas são importantes para prestígio dos falantes. O interiorano que nunca falou português entre nós e nunca falou i9taliano oficial na Itália, com decisões políticas favoráveis, serão importantes esteios na manutenção dos idiomas, como bases de formas diferentes de identidades. A Itália, pela lei 153, estende o ensino do italiano oficial ao mundo, sem se dar conta que, de fato, a grande emigração, sobretudo de 1860 a 1914, partiu para diferentes pontos do planeta, falando seu idioma regional, provincial, comunal e, por vezes, com típicas características familiares. Dos diferentes falares vênetos, lombardos, trentinos, friulanos e outros constituiu-se aqui o Talian, como língua que hospeda as demais, com prevalência vêneta por a maioria dos imigrantes serem vênetos. A sobrevivência do Talian depende de ele conseguir respaldo político e prestígio social e uma consciência crítica que venha a se criar pelo valor intransferível de ser a língua materna, que uma vez perdida, perde o afetivo próprio. Aprender a língua que foi dos antepassados, depois que nada dela se conhece, não é aprender uma língua envolvente e sentimental, mas uma língua artificial como as demais. Então, até que alguns falam e compreendem, outros compreendem embora não falem, é o tempo precioso de salvar a base das diferentes identidades familiares, através do Taliam, que deixa caminho aberto à retomada das variantes regionais e provinciais da Itália.

Quais são suas leituras preferidas?

Eu gosto de ler, mas não me apego a este ou aquele literato. Gosto muito de José de Alencar, cearense e casualmente o Ceará é homenageado nesta Feira do Livro; são os 140 anos do Iracema. Eu comecei lendo o Tronco do Ipê. Ele escreve aventuras à beira de rios, raízes de árvores…Eu perguntava: onde será que estão estas árvores? Quando ia para casa – nós morávamos perto de um rio – tem um angico que dobra em cima do rio, eu achava qye aquela era uma das árvores descritas, mas faltavam as famosas raízes serpeando na barranca do rio.

Depois, na área da filosofia, tem Martin Buber. Um livro fantástico, que envolve história, cultura, análise até da perspectiva social é O Nome da Rosa. A partir dele, todos os livros do Umberto Eco. Até Como se faz uma tese é inovador. A proposta acadêmicca não é aquela proposta americana, assim materializada, totalmente esquematizada, parece que é só preencher um quadrinho.

Publicado por Celso Augusto Uequed Pitol |

Nenhum comentário: